A concentração, ou o uso consistente e persistente da atenção na direção de qualquer coisa que queiramos fazer, é reconhecida há muito tempo como o meio mais eficaz de chegar à completa expressão dos nossos poderes e das nossas energias. Os antigos chamavam de “unidirecionalidade” o poder de focar a atenção sobre um assunto ou objeto durante o tempo que for necessário, com a exclusão de todos os outros pensamentos e sentimentos. A concentração é difícil de obter entre nós porque, na verdade, a nota-chave da nossa civilização é mais a distração do que a concentração.
São apresentados constantemente às nossas mentes objetos e assuntos que apontam para todas as direções. Uma coisa após a outra chamam a nossa atenção e em seguida nos afastam daquilo em que estamos nos concentrando. Assim, nossas mentes adquiriram a tendência de saltar de uma coisa para a outra; de voar para uma idéia agradável, ou para uma idéia desagradável; de ficarem passivas. Permanecer na passividade corresponde normalmente ao sono; excepcionalmente, tende à insanidade. Que nós tenhamos nos acostumado a estas distrações e não sejamos capazes de dedicar nossas mentes a determinada coisa por determinado tempo é algo que pode ser facilmente comprovado por qualquer um. Se alguém sentar-se e tentar pensar em uma só coisa – um só objeto ou assunto – por apenas cinco minutos, talvez bastem poucos segundos para que descubra que está a quilômetros de distância da coisa sobre a qual pretendia concentrar sua mente.
Temos primeiro que compreender o que o homem é, a sua real natureza, qual a causa da sua situação atual; e só depois disso poderemos chegar a qualquer concentração pura e verdadeira; só depois poderemos usar a mente superior e as energias que fluem dela. Porque as energias que usamos no corpo são de fato energias transmitidas, ou tiradas, da nossa natureza interior e espiritual, mas tão perturbadas e limitadas que não são poderosas. Necessitamos conhecer nossas mentes, e necessitamoscontrolar nossas mentes – isto é, a mente inferior, ocupada com coisas pessoais e físicas, e conhecida na fraseologia teosófica como Manas inferior. Este é o “órgão interno”, o princípio pensante, que os antigos descreviam como o grande produtor de ilusão, o grande responsável pela ausência de concentração. Porque não há possibilidade de obter uma real concentração até que o dono da mente possa colocá-la onde ele quiser, quando ele quiser, e pelo tempo que ele desejar.
Está escrito na obra “A Voz do Silêncio”, de H.P. Blavatsky: “A Mente é o grande assassino do Real. Que o discípulo mate o Assassino.” O discípulo, que é o Homem Real – o homem espiritual – deve atuar como tal. Ele tem que parar as mudanças e oscilações do seu princípio pensante e tornar-se calmo naquele conhecimento que é trazido pela contemplação da sua própria natureza real. O objetivo de todo progresso é a compreensão da verdadeira natureza própria de cada um, e o uso dos poderes que pertencem a ela. O obstáculo está no princípio pensante. NÓS somos os pensadores, mas não somos aquilo que pensamos. Se pensamos de modo errado, então todos os resultados dos nossos pensamentos e ações devem levar-nos a uma conclusão errada, ou a uma conclusão parcial, na melhor das hipóteses ; mas se compreendermos que nós somos o pensador, e o criador – aquele através de quem surgiram todas as condições em que estivemos no passado, as condições em que estamos agora, e em que estaremos no futuro – então alcançamos o ponto de vista do homem Real, e é apenas ao homem Real que pertence o poder da concentração.
Para obter concentração, necessitamos compreender a classificação dos princípíos do homem. Todos temos os mesmos princípios, o mesmo tipo de substâncias e o mesmo espírito dentro de nós. Todos contemos cada um dos elementos que existem em todo lugar e em qualquer ser. Assim, também, cada um tem todos os poderes que existem em qualquer lugar e em si mesmo, embora latentes. Somos todos da mesma Fonte, somos partes de um grande Todo, somos todos centelhas e raios do Espírito Infinito ou Princípio Absoluto.
O segundo princípio é Buddhi, a sabedoria adquirida de vidas passadas e também nesta vida. Buddhi é a nata de todas nossas experiências passadas. O próximo princípio é Manas, a Mente Superior, o real poder de pensar, o criador – que não se preocupa com esta fase física da existência, mas com o espírito e a sabedoria adquirida. Juntos, estes três princípios formam o Homem Real – Atma-Buddhi-Manas –; e cada um de nós é estes três, em sua natureza interior.
Nosso Manas Inferior é o aspecto transitório da mente Superior; isto é, aquela parcela da nossa atenção, dos nossos pensamentos e sentimentos, que está dedicada à vida em um corpo. Mas se a nossa função de pensar se preocupa só com o eu pessoal – apenas com o corpo – os poderes que estão na Tríade, o homem Real, e a sabedoria adquirida no passado, não podem impôr-se através desta nuvem de ilusão.Manas Inferior é o princípio do equilíbrio. É o lugar a partir do qual o homem que está em um corpo sobe, em direção a sua natureza superior, ou desce, em direção à sua natureza terrestre, feita pelos desejos que pertencem à natureza sensorial. A vida ao nosso redor está o tempo todo lançando sobre nós as suas impressões e suas energias. Estamos constantemente sujeitos a elas, e ligados a elas, através das nossas idéias, das nossas emoções e dos nossos sentimentos; de modo que há um constante tumulto dentro daquela mente interna, e isto constitui uma barreira à calma e à concentração absolutas.
A seguir temos o corpo astral, em si mesmo um aspecto do real corpo interno que tem durado ao longo de um vasto período de tempo, e que deve continuar até um futuro muito distante. Este corpo astral é o protótipo, ou modelo, em torno do qual o corpo físico é construído, e que, considerado do ponto de vista dos poderes, é o real corpo físico. Sem ele, o corpo físico seria apenas uma massa de matéria – um agregado de vidas menores. É o corpo astral que contém os órgãos, ou melhor, os centros a partir dos quais os órgãos têm evoluído de acordo com as necessidades do pensador interno. Os verdadeiros sentidos do homem não estão no corpo físico, mas no corpo astral. O corpo astral dura pouco mais que uma encarnação física: ele não morre quando o corpo físico morre, mas é usado como corpo no estágio imediato do pós-morte.
A partir do momento em que começamos o esforço para controlar a mente, e desejamos saber e assumir a posição do homem interno, o esforço e a atitude produzem um aumento de energia e firmeza. Fizemos com que algo começasse a acontecer no corpo astral. O que antes eram meros centros de força em torno dos quais os órgãos eram construídos, agora tendem a se tornar orgãos astrais independentes. Ocorre dentro de nós uma gradual construção destes órgãos, até que, quando se completa o esforço, temos um corpo astral com todos os órgãos do corpo físico sintetizados, e estamos além das vicissitudes da existência física; temos o poder que é a ação do corpo astral. O corpo astral é ainda mais completo e eficiente, em seu próprio plano, que o nosso instrumento corporal aqui no plano físico, porque ele tem um alcance mais amplo de ação em seus sete super-sentidos, enquanto que fisicamente só usamos cinco sentidos.
Muitos obstáculos aparecem, no entanto, assim que começa o esforço. Velhos hábitos de pensamento e de sentimento nos pressionam em todos os sentidos, porque ainda não somos capazes de controlar as nossas respostas a eles, e assim nos vemos sujeitos a certos sentimentos e emoções que tendem a destruir o corpo astral que está sendo construído. O primeiro fator, e o mais forte, é a raiva. A raiva tem um efeito explosivo, e por mais que possamos ter progredido em nosso crescimento, o choque interior incontrolável que vem da raiva irá reduzir a pedaços aquele corpo astral em construção, de modo que todo o trabalho tem de ser feito outra vez. O próximo fator a combater é a vaidade –; vaidade deste ou daquele tipo, por causa de alguma meta alcançada, ou em relação a nós mesmos, nossa família, nosso país e assim por diante. A vaidade tende a crescer cada vez mais, até que finalmente já não escutamos ninguém, e somos tão superficiais que não podemos mais aprender coisa alguma. Assim, a vaidade tende a desintegrar este corpo interno, embora ela seja menos destrutiva que a raiva. A inveja é outro obstáculo. O medo também, mas o medo é o menor deles porque ele é sempre resultado da ignorância. Temos medo das coisas que não conhecemos; mas quando as conhecemos, não temos medo.
Todos temos medos que tendem destruir o instrumento através do qual a verdadeira concentração pode ser alcançada; mesmo assim, é possível alcançá-la. O poder e a natureza específicos da concentração estão no fato de que, quando ela é completa, podemos colocar a atenção em qualquer assunto ou objeto, com a exclusão de todos os outros, durante qualquer período de tempo; e este princípio pensante – essa nossa mente que tem estado oscilando para lá e para cá – pode ser utilizada para adaptar-se ao objeto observado, à natureza do objeto em que se pensa. Enquanto a mente toma a forma do objeto, nós percebemos através daquela forma as características que fluem através dela; e, quando nossa investigação está completa, somos capazes de saber tudo o que pode ser conhecido daquele assunto ou objeto.
É fácil ver que um tal nível de concentração não pode ser alcançado através de esforços intermitentes. São necessários esforços feitos a partir de “uma posição assumida com firmeza”, em relação ao objetivo buscado. Todos os esforços feitos sobre esta base estão destinados a ser úteis; cada esforço feito desde o ponto de vista do homem espiritual conta positivamente, porque torna o corpo subserviente ao princípio pensante.
Há outras coisas que surgem a partir deste verdadeiro poder de concentração. Começamos a abrir os canais que vão do nosso cérebro ao corpo astral, e do corpo astral até o ser interior. Assim, aquilo que é temporário tende a se tornar parte daquilo que é eterno. Todos os planos se tornam sintetizados de cima para baixo, e todas as vestimentas da alma, que nós produzimos ao longo do tempo, ficam em harmonia umas com as outras. É como ocorre com os mecanismos de uma fechadura: quando eles trabalham juntos, a fechadura funciona adequadamente. Assim, também, nós temos que colocar todas as camadas da alma em perfeita concordância entre si, e isso nós só podemos fazer adotando a posição de um ser espiritual, e atuando como tal.
O nível em que a concentração ocorre é possível para nós, mas não seria possível sobre uma base egoísta. A concentração da mente cerebral é tão pequena – se comparada com a verdadeira concentração – quanto a luz de uma vela diante da luz do sol. A verdadeira concentração é, em primeiro lugar, uma posição assumida a partir da meta da união com o Eu Superior. Esta é a mais altaIoga. A concentração sobre o Eu Superior é a verdadeira concentração. E a concentração deve ser alcançada antes que nós possamos atingir aquele estágio em que o conhecimento eterno em todos os seus aspectos é nosso até o último grau; antes que possamos uma vez mais recuperar e dominar aqueles poderes que são uma herança de todos.
Título original do texto: “Culture of Concentration”. Traduzido da obra “The Friendly Philosopher”, de Robert Crosbie, Theosophy Company, Los Angeles, 1945, 416 pp., ver pp. 290-294. Robert Crosbie fundou a L.U.T. em Los Angeles em fevereiro de 1909.
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